Foto Divulgação: Dinarci Borges
Nascido na cidade do Rio de Janeiro em 1972 e radicado no Rio Grande do Sul desde 1999, o cineasta carioca Luiz Rangel já recebeu diversos prêmios, entre eles: o Prêmio de Cinema Gaúcho José Lewgoy oferecido pelo Estado do Rio Grande do Sul. Luiz Rangel tem hoje os seus trabalhos exibidos internacionalmente, ele já trabalhou com atrizes e atores como Via Negromonte, Claudia Alencar, Luciano Szafir, Carlo Mossy e Mário Frias. Luiz Rangel estará produzindo agora o seu segundo longa-metragem e concede entrevista exclusiva ao Jornal Porto Alegre.
Jornal Porto Alegre: Luiz Rangel como começou a sua carreira?
Luiz Rangel: A minha carreira começou quando eu ainda era muito jovem. Ingressei no teatro quando tinha 16 anos no Rio de Janeiro (Escola de Teatro Martins Pena), logo em seguida fui cursar comunicação social, onde me especializei na época em RTVC. De lá pra cá tive inúmeras atividades no meio da comunicação, entre elas: fui também radialista, tive em 1997 um programa de rádio, na Simplesmente Copacabana FM, onde tive o prazer de conhecer o grande cineasta Carlo Mossy; em 1999 me mudei para Porto Alegre onde residi até o ano de 2009. Durante este período da minha vida fui produtor e diretor de vários programas para a TV Fechada do Rio Grande do Sul - mas não sinto a mínima saudade desta época, com salvas exceções - Gilberto Simões Pires é uma delas, grande profissional e aprendi muita coisa positiva e importante com ele, trabalhamos quase dez anos juntos - mas na maioria foi muito desgastante, pois encontrei muita gente amadora que pagava para ter espaço em canais de baixa categoria e se autodenominavam colunistas sociais, Jornalistas, publicitários e etc. sendo que muitos mal sabiam escrever o próprio nome e na realidade não passavam de pessoas que sonhavam em ir para a TV sem ter a preocupação de estudarem para isso. Nesta época tive que ver verdadeiras atrocidades serem cometidas, vi coisas que me agrediam como profissional, que iam contra tudo o que aprendi, estudei e ensinava e sem falar também que isso me gerou um desgaste muito grande. Foi quando decidi ir largando a produção dos outros e comecei a me voltar para os meus projetos, entre eles: os meus dois programas de TV e o meu cinema, e comecei a me preocupar menos com a comunicação e me dedicar mais a arte, então quando me dei conta havia transitado do meio da comunicação para o meio artístico e aí sim tive a oportunidade de expressar o meu olhar, a minha maneira de pensar e responder por mim.
Jornal Porto Alegre: Como foi a escolha de sair do Rio de Janeiro para vir morar e trabalhar em Porto Alegre? Algo a ver com a violência do Rio?
Luiz Rangel: O Rio de Janeiro é uma capital como qualquer outra, para ser sincero quando vou ao Rio - diga-se de passagem, que isso é constante - ando mais tranquilo e me sinto muito mais seguro do que quando ando em Porto Alegre. A grande diferença é que os noticiários não se interessam em mostrar o que acontece no restante do país. Se formos nos guiar pela mídia nacional, crimes só acontecem no Rio e São Paulo e no restante do Brasil só temos enchentes ou tornados - e todos nós sabemos que isso não é uma verdade, a criminalidade é grande em todos os centros urbanos, a epidemia do Crack assola a nossa sociedade e por aí coisas piores ocorrem. Minha vinda para o Sul se deve ao fato de eu ter acreditado no Mercosul e só chegando aqui percebi que ele não existe - e sinceramente não sei se algum dia irá existir - mas já era tarde, já havia comprado e vendido uma ideia e me coube assumir as consequências por minha escolha, em suma estou aqui estabelecido há 13 anos e caminhando hoje para um link profissional no Rio. Aqui me casei, tive um filho, fiz grandes amigos e me tornei cidadão gaúcho, faço um cinema no Rio Grande do Sul, pago os meus impostos também aqui no estado (deixando claro que no RS se cobra e muito) e voto aqui também, mas infelizmente os meus candidatos não tem sido eleitos, mas não desisto, sigo em frente e com este caminho aberto hoje no Rio, acredito que em um futuro muito breve estarei fazendo mais no Rio Grande do Sul, pois neste estado o meu vinculo são com as pessoas que aqui cativei o gaúcho quando te tira para amigo é porque ele acaba sendo mais do que um parente e isso eu nunca vi em lugar nenhum que eu já tenha conhecido e morado.
Jornal Porto Alegre: Qual seria esse link profissional com o Rio de Janeiro?
Luiz Rangel: Muitos produtores do Rio Grande do Sul, principalmente de Porto Alegre, pegam verbas astronômicas com instituições governamentais e na hora de fazerem o filme ou vão para o Sudeste ou trazem o Sudeste para fazer o filme aqui e aproveitar o povo gaúcho com os recursos advindos daqui que seria o honesto, não ocorre. O que quero fazer é muito simples, ou seja, unir, agregar, dar a oportunidade do ator e técnico gaúcho de trabalhar junto com atores e técnicos do grande eixo Rio - SP. Deixa-me triste ver gaúchos indo para o Sudeste, gastarem o que não tem morando em vagas para tentarem um teste de figuração em uma novela, isso não faz e não tem sentido. Quem é bom tem que ser chamado e não se oferecer, uso este principio para a minha vida e é assim que construí a minha carreira até hoje. Este link se resume em usar o que tenho no Rio aqui no Rio Grande.
Jornal Porto Alegre: Recentemente você realizou o Longa-metragem Réquiem Para Laura Martin e o filme foi ganhador de dois prêmios importantes, Melhor Direção e Melhor Atriz, isso se deve ao que? A sorte, maturidade profissional ou ao fato de teres uma coprodução e uma codireção de SP?
Luiz Rangel: Eu particularmente não acredito em sorte, acredito sim, em falta de sorte, acho que tudo é resultado do que fazemos, um bom resultado é fruto de um trabalho bem feito e costumamos chamar isso de sorte, um mal resultado na maioria é fruto de um trabalho mal feito, a isso normalmente responsabilizamos aos outros e quando o mal resultado é fruto de um trabalho bem feito, dizemos que é falta de sorte, enfim, a palavra sorte é algo muito abstrato e não gosto de coisas abstratas. A maturidade profissional é algo maravilhoso e estou sempre tentando alcançá-la, a cada contato, a cada trabalho, a cada tecnologia nova e sei que ela nunca será verdadeiramente alcançada por mim e por ninguém, principalmente no meio audiovisual. A maturidade profissional no cinema é algo que sempre vai estar no objetivo e nunca vai ser atingida, o cinema se move por si e quando pensamos que sabemos tudo, chega uma nova câmera, uma nova linguagem e lá estamos novamente tendo que aprender tudo de novo. Nunca havia feito coprodução em minha carreira e nem na carreira da minha empresa, foi à primeira vez e só fiz para dar força a um amigo de São Paulo, dar a esta empresa um currículo o qual ela não possuía e o mesmo se aplicou a ele, daí veio à coprodução e codireção que entraram depois do trabalho de fato ter sido realizado, entraram por consideração e por uma pequena ajuda na pós-finalização do filme. Acho que o prêmio se deve mesmo ao fato do filme ter agradado ao júri, a um bom trabalho de direção e a interpretação única da atriz Claudia Alencar.
Daniel Bertolucci Secretário de Cultura de Gramado Entrega kikito a Luiz Rangel
Jornal Porto Alegre: Quem mais além da Claudia Alencar participou deste filme?
Luiz Rangel: O Réquiem Para Laura Martin foi um filme que aconteceu, ele não foi planejado, era para ser um curta-metragem, que acabou com roteiro de média metragem e a meu pedido foi estendido para longa-metragem. No inicio eu havia convidado para participar do que seria um curta as atrizes Via Negromonte (já trabalhamos juntos anteriormente) e Vera Gimenez e o ator Anselmo Vasconcellos, o qual há muitos anos já havia me pedido para fazer um filme comigo. No andar de todo o processo a Via e a Vera não puderam vir fazer o filme e entrou a Claudia Alencar e uma atriz novata para cobrir os personagens, tudo que antes era pequeno tomou grandes proporções e felizmente as rédeas não foram perdidas, com o crescimento do projeto convidei a agregar o filme os atores Luciano Szafir e Carlo Mossy (também produtor e diretor) e oportunizei a atriz gaúcha Ana Paula Serpa a ter o seu primeiro papel como protagonista em um filme de longa-metragem. Confesso que o trabalho em si não foi fácil, muito pelo contrario, enfrentei muitas dificuldades, não com a produção, mas sim com alguns integrantes do elenco, atores que já se encontravam esquecidos ou que nunca protagonizaram algo começaram uma fogueira de vaidades terrível e comecei a entender porque atores que foram bons na década de 1970 e 1980 atualmente estavam reduzidos a pequenas participações em programas humorísticos ao invés de fazerem jus ao que já foram um dia e fui obrigado a entender determinadas questões que eu, como ser humano, até então ignorava e aprendi muito com todo esse processo. Resumindo, Carlo Mossy e Luciano Szafir são atores que se depender de mim estarão em todos os meus projetos e sobre oportunizar para iniciantes, aprendi também que tenho que estudar o iniciante não só como ator, mas como ser humano também, aprendemos que em uma equipe o caráter é muitas vezes mais importante do que o talento. Um diretor precisa de cumplicidade, de desprendimento de ego de seus atores e equipe - e não de medição.
Jornal Porto Alegre: Você diz em chamar Luciano Szafir e Carlo Mossy para futuros projetos seus, por quê? Existe também algo em andamento?
Luiz Rangel: Luciano Szafir e Carlo Mossy já realizaram dois trabalhos comigo anteriormente, o Szafir fez anteriormente o curta-metragem "Acerto de Contas" e depois participou no Réquiem Para Laura Martin; o Mossy fez o curta-metragem "Luz de Velas" e também participou do Réquiem Para Laura Martin. Ambos além de profissionais dedicados, maravilhosos e que tem muito para passar, são antes de tudo seres humanos únicos, são generosos, humildes e abraçam a causa. Mesmo pertencendo a gerações totalmente diferentes os dois entram em cena e estão sempre sorrindo, sempre procurando ajudar em algo que às vezes nem sequer faz parte de suas funções e isso não tem preço que pague em um set de filmagens, estes são os motivos e tenho a certeza de que os dois não são assim somente comigo. Quanto a futuros projetos tenho sim, sempre tenho, vou rodar em julho de 2012 o longa-metragem "Ódio" que se trata de um remake de um filme feito em 1975 produzido, dirigido e atuado por Carlo Mossy (é visível à generosidade dele), que foi um grande sucesso na época e estou tendo a honra de poder produzir e dirigir agora a versão dos anos 2000. Neste atual projeto estou contando com as presenças confirmadas de Luciano Szafir, Mário Frias, Carlo Mossy e André Ramiro e estou em tratativas também com Milhem Cortaz, Guilherme Piva, Edwin Louisi, Via Negromonte e Tuca Andrada.
Luciano Szafir, Carlo Mossy e Luiz Rangel
Jornal Porto Alegre: Você acredita na cultura como ferramenta de inclusão social?
Luiz Rangel: Tanto eu quanto os governantes acreditam nisso, a prova que os governantes acreditam é que eles não investem, sabem que um povo culto seria mais difícil de governar com administrações medíocres e que muitos políticos não seriam de longe eleitos, por isso a grande dificuldade em se fazer cultura nesse país. Agora eu, acredito e muito, inclusive estava fazendo até o final de 2009 um trabalho de inclusão social através do cinema, trabalho este na época fomentado pela Subsecretaria de Cultura de Gramado/RS, mas infelizmente o interesse da prefeitura pelo projeto cessou e o mesmo não existe mais, uma pena, pois há provas que o cinema pode salvar pessoas da ignorância, da criminalidade, pode fazer pessoas crescerem, uma prova disso é o próprio rapaz que assina a codireção do longa-metragem Réquiem Para Laura Martin comigo - o Paulo Duarte. Ele morava em uma comunidade carente de São Paulo e graças ao cinema não teve o mesmo destino de outros membros de sua comunidade, tendo hoje viajado quase o mundo todo e assinado um trabalho ao meu lado.
Jornal Porto Alegre: O que um ator necessita para trabalhar com Luiz Rangel?
Luiz Rangel: Um ator para trabalhar comigo necessita ser habilitado a viver. Infelizmente muitas pessoas não são habilitadas a vida, e não sabem o básico para viver em grupo, não sabem que o respeito é à base de tudo e que sem ele nada se consegue. Hierarquia é tudo num set, deixando claro que diretor não é patrão, não é dono, mas é o cara que está ali para passar o olhar do futuro público e o público é soberano em seu julgamento, sendo assim esta é a responsabilidade do diretor e ela tem que ser respeitada, se o ator não está disposto a obedecer o diretor que ele não faça parte do elenco, mas se entrou no elenco, entrou para obedecer e fazer o que é proposto, como diz o próprio Carlo Mossy: "Ser dirigido é o mesmo que embarcar em um avião, você não levanta da sua cadeira para questionar o piloto, o mesmo um ator deve fazer em relação a seu diretor".
Jornal Porto Alegre: Como funcionam as oficinas e workshops ministrados por você?
Luiz Rangel: Funcionam como infelizmente nenhuma outra oficina ou workshop funciona no Brasil, é a única que o ator ou aspirante a ator tem a oportunidade de estar direto com um diretor de verdade, entendendo como realmente funciona o meio e as questões profissionais pertinentes. Gostaria que mais colegas fizessem o que eu faço, mas não, o que mais vejo é gente que vende curso se dizendo diretor sem nunca ter feito um único vídeo de aniversário, quanto mais um filme ou ter realmente condições de passar algo concreto a alguém.
Jornal Porto Alegre: Como você normalmente seleciona o seu elenco?
Luiz Rangel: Sempre busco primeiro em minhas oficinas, procuro acreditar em quem acredita em mim, sempre deu certo esta estratégia e sempre vai continuar funcionando.
Jornal Porto Alegre: Como funcionam os seus dois programas de Tv?
Luiz Rangel: Tenho o Plano Geral e Plano Geral Cinema, eles foram criados perante a necessidade de divulgação dos trabalhos que eu realizava e em consequência passaram a mostrar as empresas e empresários que tornavam viáveis os meus projetos no cinema. Sempre cuidei e cuido muito para não cair na vala comum da maioria dos programas que existem na Tv a cabo, que de forma vergonhosa e às vezes criminosa comercializam os seus espaços. Hoje qualquer um que possa pagar por um espaço no Canal 20 da Net de Porto Alegre, pega espaço, grava o programa com uma câmera caseira, edita normalmente em Movie Maker e no dia seguinte tira o identificador de chamadas do celular para ligar para os seus anunciantes se passando por clientes e dizendo que viu a empresa ou produto anunciados na TV. Digo o que já vi acontecer inúmeras vezes, esse tipo de TV eu abomino, eu acho que é caso de policia, me recuso a trabalhar com profissionais assim, vamos fazer a coisa com seriedade, não é fácil ser sério, mas não é impossível, graças a Deus tenho sido todos estes anos e não pretendo deixar de ser agora.
Luiz Rangel Recebe o Prêmio José Lewgoy de Cinema Gaúcho 2008
Jornal Porto Alegre: Existe alguma consideração final que você gostaria de deixar aqui registrada?
Luiz Rangel: Sim. Peço ao empresário para que acorde para o cinema e veja que não só estará divulgando a sua marca em um filme, mas também eternizando a sua imagem. Muitas empresas gastam verdadeiras fortunas em mídia eletrônica e impressa e não param para ver que em um filme ele vai gastar muito menos e vai ter o seu registro de forma constante, quer exemplos? Quantas vezes lembramo-nos de comprar Coca-Cola, por que vimos um personagem beber o refrigerante em questão de uma cena? Quantas vezes procuramos determinadas companhias aéreas para viajar para o exterior porque as vimos em determinados filmes? Há duvida da quantidade de tabagistas que existem hoje graças às cenas charmosas em que apareciam fumantes nos filmes antigos de Hollywood?
É só parar para ver e acordar para o obvio! Antes de se pagar uma nota em um programa de tv a cabo no qual só se vai aparecer para os seus amigos e vizinhos, pense em entrar para a história e aparecer para todo mundo em um filme.
Um abraço a todos, Luiz Rangel.
Fonte: Jornal Porto Alegre (www.jornalportoalegre.com.br) e Blog de Luiz Rangel (http://cineastaluizrangel.blogspot.com).
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