Em novembro a Sala Redenção – Cinema Universitário dedica sua programação ao cinema iraniano exibindo filmes de alguns dos principais cineastas do país desde o final da década de 1980. Segundo Alessandra Meleiro* “o Irã produziu o mais denso conjunto de autores desde o novo cinema alemão na década de 1970” (2008, p. 338). A “revolução iraniana”, ocorrida em 1979 transforma o Irã, até então governado pelo monarca Xá Mohammad Reza Pahlevi, em uma república islâmica que, ainda segundo Meleiro, é única forma de governo no mundo em que “Islã” e “república” caminham juntos. Se num primeiro momento, houve uma aliança entre grupos liberais, grupos de esquerda e religiosos para depor o Xá, em um segundo, quando a revolução começa a ser chamada de “islâmica”, ela passa a ser governada pelos aiatolás sob o comando do líder religioso Ruhollah Khomeini. Com a queda do Xá, houve o retorno a valores antigos e várias tradições voltaram a ser “impostas”. A relação com o Ocidente foi suspensa e os preceitos do Alcorão eram seguidos de forma extrema. Com a morte de Khomeini, sobe ao poder líderes menos extremados e, nos anos 1990, no comando de Mohammad Khatami, o Irã volta a se abrir para o Ocidente. Foi um período de grande importância para o cinema, já que vários cineastas iranianos ficaram conhecidos com a presença regular em festivais internacionais, mesmo que ainda sofrendo censuras em seu país, trabalhando com limitações orçamentárias e com equipamentos precários. Em 1999, o governo iraniano realiza uma ampla reforma econômica na área cinematográfica, facilitando a entrada de bens e de serviços para as atividades ligadas ao cinema, facilitando a exportação de filmes iranianos. Companhias cinematográficas estrangeiras passaram a produzir filmes de autor de forma interna e externa, beneficiando vários cineastas iranianos. Cineastas como os Kiarostami, Makhmalbaf, Panahi, Majidi, Farhadi entre outros, passam a ter reconhecimento internacional ao mesmo tempo em que provocam um grande impacto em seu país por construírem, de formas diferentes, críticas à sociedade. Se num primeiro momento, na década anterior, tais diretores realizavam um cinema mais “humanista”, passam a fazer um cinema com maiores implicações políticas. A escolha de crianças para protagonistas dos filmes como veículo de crítica social e a utilização de metáforas para abordar a opressão social dá cada vez mais lugar para filmes que abordam a situação das mulheres iranianas, por exemplo. Nesta mostra, exibiremos seis longas de Abbas Kiarostami. Onde fica a casa de meu amigo? (1987), Close up (1990), Vida e nada mais (1992), Através das oliveiras (1994), Gosto de cereja (1997) e Dez (2002), um filme que rompe e elimina várias convenções do cinema clássico, inclusive a presença do diretor e do fotógrafo no set, já que filma apenas com uma câmera digital no painel do carro, controlada a distância pelo diretor. Longas que apresentaram Kiarostami ao ocidente; um cineasta que produz desde os anos 1960 e que continuou produzindo mesmo após a revolução. Um cineasta que realiza filmes que lembram os do neorrealismo italiano – por ser adepto a uma escola que faz pouco uso do estúdio, sem uma mise-en-scène elaborada, com personagens em situações “de uma realidade imediata”, filmando com câmera na mão – para assim denunciar os problemas sociais, criticar o autoritarismo e o conservadorismo do governo iraniano em relação ao próprio cinema. No entanto, Alessandra Meleiro coloca que “há algo muito específico a respeito do realismo cinematográfico iraniano que não pode reduzido ao italiano ou a qualquer outro neorrealismo” (p. 349). De Mohsen Makhmalbaf, exibiremos quatro filmes. Gabbeh (1996), que obteve um grande reconhecimento de público, Salve o Cinema (1995), A caminho de Kandahar (2001) e Um dia muito especial (2005). Diretor de estilo e de temática marcantes, na primeira fase de sua produção o fundamentalismo religioso se faz presente – fundamentalismo este que será cada vez mais substituído pelo político, quando passa a refletir sobre a impossibilidade de a revolução resolver os problemas do Irã. A partir de então, seus filmes mostram o desapontamento e o crescente empenho pela busca da liberdade e da livre expressão. De Jafar Panahi, exibiremos O balão branco (1995), O espelho (1997), O Círculo (2000) e Isto não é um filme (2010). Um diretor combativo que realiza filmes de forte denuncia contra a situação social e contra perseguição à mulher iraniana. Acusado de fazer propaganda contra a revolução islâmica e de apoiar os opositores do atual presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad. Panahi foi condenado a seis anos de prisão e a vinte anos sem poder filmar. Isto não um filme (2010), codirigido por Mojtaba Mirtahmasb, tematiza justamente as possibilidades de um diretor que não pode realizar seu filme. O longa, mistura de ficção com documentário em uma espécie de “não filme”, foi exibido no Festival de Cannes em 2011, depois de ter saído do país, de forma clandestina, em um pen drive, dentro de um bolo. De Samira Makhmalbaf, filha de Mohsen Makhmalbaf, exibiremos A maçã (1998) e Às cinco da tarde (2003). De Majid Majidi, contamos com Filhos do paraíso (1998) e A cor do paraíso (1998). Asghar Farhadi marca presença com Procurando Elly (2009) e com o celebrado A separação (2011), que movimentou a cena cinematográfica no último ano, sendo vencedor de vários prêmios, entre eles o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro. Fazendo uso do tema do divórcio, Farhadi não apenas critica o atraso e a hipocrisia da sociedade fundamentalista iraniana, como também narra uma história que não deixa de ser universal, com seus dramas e tragédias – mesmo que no Irã os fatos adquiram outra dimensão. E novamente a câmera na mão serve de recurso para que os dramas dos personagens fiquem mais próximos de nossos próprios dramas. Eis a programação de novembro para a Sala Redenção: esta é a maneira que encontramos de homenagear o novo cinema iraniano com sua forma de fazer cinema que está tão longe e tão próxima de nós (Tânia Cardoso de Cardoso, curadora).
* MELEIRO, Alessandra. O novo cinema Iraniano. In: BAPTISTA, Mauro; MASCARELLO, Fernando (ORG). Cinema mundial Contemporâneo, Campinas: Papirus, 2008, p. 352.
Serviço
O Quê: Cinema Iraniano em foco
Quando: 01 a 30 de novembro
Onde: Sala Redenção – Cinema Universitário (Rua Eng. Luiz Englert, s/n., Campus Central UFRGS
Quanto: Entrada Franca
Acompanhe! A ficha técnica, a programação e a sinopse dos filmes do “Cinema Iraniano em foco”.
Onde fica a casa do meu amigo? (Khane-ye doust kodjast?, Irã, 1987, 83 min.) Dir. Abbas Kiarostami
01 de novembro – 5ª feira – 16h
Ao fazer o seu dever de casa, Ahmad descobre que pegou o caderno do seu amigo por engano. Sabendo que o professor exige que as tarefas sejam feitas no caderno, ele vai a vila vizinha com o intuito de encontrar o amigo e então devolver o caderno. Ahmad não consegue encontrar seu amigo, pois não sabe onde ele mora. Ele decide então voltar para casa e fazer a lição de casa do seu amigo.
Close-up (Nema-ye Nazdik, Irã, 1990, 90 min.) Dir. Abbas Kiarostami
01 de novembro – 5ª feira – 19h
05 de novembro – 2ª feira – 16h
Diretor de cinema investiga o caso real de um jovem que foi preso ao se fazer passar por um dos cineastas mais famosos do Irã. Seus acusadores são uma família rica que o acolheu, pensando que ele realmente era o cineasta. O diretor pede permissão especial para filmar o julgamento, registrando, em close, as reações do réu.
Vida e nada mais (Zendegi va digar hich, Irã, 1992, 95 min.) Dir. Abbas Kiarostami
05 de novembro – 2ª feira – 19h
06 de novembro – 3ª feira – 16h
Depois do terremoto de Guilan, um diretor de cinema e seu filho viajam até a área devastada em busca dos atores que haviam estrelado um filme seu, alguns anos antes. Na busca, eles descobrem que as pessoas que perderam tudo no terremoto ainda tem esperança para seguir em frente.
Através das oliveiras (Zire Darakhatan Zeyton, Irã, 1994, 103 min.) Dir. Abbas Kiarostami
06 de novembro – 3ª feira – 19h
07 de novembro – 4ª feira – 16h
Um cineasta filma no interior do Irã, numa região marcada pela pobreza e abalada por um terremoto. Paciente, ele conversa com as pessoas e se interessa pelos pequenos dramas de todos. Os atores são recrutados entre os habitantes e o final das filmagens acaba retardado porque dois dos selecionados não conseguem repetir as falas de uma cena banal.
Gosto de cereja (Ta'm e Guilass, Irã, 1997, 95 min.) Dir. Abbas Kiarostami
08 de novembro – 5ª feira – 19h
09 de novembro – 6ª feira – 16h
Um homem em Teerã contrata um velho soldado para um trabalho estranho: ao amanhecer do dia, seguinte chamá-lo duas vezes perto de uma cova aberta; se ele responder deve ajuda-lo a sair, senão, sepultá-lo. Vencedor de Palma de Ouro do festival de Cannes.
Dez (Dah, 2002, Irã, 91 min.) Dir. Abbas Kiarostami
08 de novembro – 5ª feira – 16h
09 de novembro – 6ª feira – 19h
Dez pequenas histórias sobre as vidas emocionais de seis mulheres e as maneiras como elas devem lidar com determinadas situação, observadas de diferentes pontos de vista.
Gabbeh (Gabbeh, Irã, 1996, 75 min.) Dir. Mohsen Makhmalbaf
12 de novembro – 2ª feira – 16h
Proibida de juntar-se a seu amante, jovem disfarça suas frustrações através dos fios que tecem um intricado e belo tapete, ao qual empresta seus mais profundos sentimentos.
Salve o cinema (Salaam Cinema, Irã, 1995, 75 min.) Dir. Mohsen Makhmalbaf
12 de novembro – 2ª feira – 19h
13 de novembro – 3ª feira – 16h
O diretor iraniano Mohsen Makhmalbaf resolveu filmar o incansável esforço de anônimos candidatos tentando ingressar no fascinante mundo de sonhos do cinema. Salve o Cinema é uma reflexão sobre a reação instintiva da humanidade de se perpetuar, deixar seu traço e se imortalizar por meio das imagens.
A caminho de Kandahar (Safar É Gandehar, 2001, Irã, 85 Min.) Dir. Mohsen Makhmalbaf
13 de novembro – 3ª feira – 19h
14 de novembro – 4ª feira – 16h
Nafas (Niloufar Pazira) é uma jovem afegã que fugiu de seu país em meio à guerra civil dos Talibãs e hoje trabalha como jornalista no Canadá. Sua irmã mais nova, que ficou no Afeganistão, lhe envia uma carta avisando que irá se suicidar antes da chegada do próximo eclipse solar. Nafas resolve então retornar ao Afeganistão a fim de tentar salvar sua irmã.
Um dia muito especial (Sex and Philosophy, 2005, Irã, 101 min.) Dir. Mohsen Makhmalbaf
19 de novembro – 2ª feira – 16h
Uma emocionante discussão sobre paixão e possessão, em uma sociedade em que mulheres e homens não dividem as mesmas regras. No seu aniversário de quarenta anos, Jan resolve mudar completamente sua vida. Liga para as suas quatro amantes e marca um encontro em sua escola de dança. As mulheres ficam chocadas quando descobrem que dividem os sentimentos do mesmo homem. Ele tenta explicar: diz que percebeu que o tempo é limitado para cada uma delas. Mais tarde, uma de suas amantes combina um encontro em sua casa, e ele descobre que o feitiço virou contra o feiticeiro e agora é ela quem tem quatro amantes.
O balão branco (Badkonake Sefid, Irã, 1995, 85 min.) Dir. Jafar Panahi
19 de novembro – 2ª feira – 19h
20 de novembro – 3ª feira – 16h
A menina Razieh (Aida Mohammadkhani) quer um novo peixinho dourado como presente de Ano Novo, um peixinho que viu numa loja e que julga ser muito mais belo que os que têm em seu quintal. Com muito esforço, convence sua mãe a lhe dar o dinheiro, mas chegar até a loja onde o peixinho está à venda será outra aventura. Para ela é uma grande experiência de liberdade e responsabilidade, que se torna mais desafiadora por vários obstáculos – os adultos ou parecem querer se aproveitar de sua ingenuidade ou não lhe dão a menor bola. Primeiro longa-metragem de Jafar Pinahi, um filme simples, sensível e divertido. Prêmio Câmera d'Or no Festival de Cannes de 1995.
O espelho (Ayneh, Irã, 1997, 95 min.) Dir. Jafar Panahi
20 de novembro – 3ª feira – 19h
21 de novembro – 4ª feira – 16h
Uma menina espera pela mãe em frente à escola. As colegas vão embora. A mãe não chega. A menina impacienta-se e resolve ir para casa sozinha, aventurando-se pelas ruas próximas. Chega até mesmo a pegar um ônibus e, durante a viagem, fica observando as pessoas a sua volta. A partir de seu universo infantil, ela começa a desvendar o complexo mundo dos adultos, vivenciando encontros inesperados e descobertas inusitadas. E a narrativa do filme passa a caminhar sobre uma fina linha que separa a ficção da realidade.
Isto não é um filme (In film nist, 2010, Irã, 77 min.) Dir. Jafar Panahi, Mojtaba Mirtahmasb
22 de novembro – 5ª feira – 16h
Retrata um dia na vida do cineasta Jafar Panahi, que está preso em casa por meses a espera do resultado de sua sentença no tribunal de apelação.
O círculo (Dayereh, Irã / Itália, 2000, 90 min.) Dir. Jafar Panahi
22 de novembro – 5ª feira – 19h
23 de novembro – 6ª feira – 16h
Três mulheres acabam de receber indultos temporários para deixar a prisão. As perspectivas, porém, não são boas. Além de terem sido condenadas, elas são mulheres e vivem em uma sociedade islâmica com seus direitos cerceados pelos homens. Não podem nem mesmo comprar uma passagem de ônibus para outra cidade.
Às cinco da tarde (Panj Ë Asr, Irã, 2003, 105 min.) Dir. Samira Makhmalbaf
23 de novembro – 6ª feira – 19h
26 de novembro – 2ª feira – 16h
O filme investiga a situação das mulheres no Afeganistão ao narrar a trajetória de Noqreh (Agheleh Rezaie), uma jovem que sonha ser candidata à Presidência da República. Assim que as escolas voltam a aceitar o sexo feminino, Noqreh retoma os estudos. Quase todas as alunas, porém, ainda usam a burca. Aos poucos, durante as aulas, instaura-se o debate em torno da condição feminina e da possibilidade das mulheres conquistarem os mesmos direitos dos homens. Com a ajuda de um poeta, Noqreh entra em conflito com o pai.
A maçã (Sib, Irã, 1998, 86 min.) Dir. Samira Makhmalbaf
26 de novembro – 2ª feira – 19h
Mulher cega e seu marido mantêm as filhas gêmeas presas, seguindo vagos preceitos do Alcorão. As meninas são soltas, após 11 anos em cativeiro, e têm que descobrir o mundo com olhos infantis que nunca conheceram nada além de sua alcova.
Filhos do paraíso (Bacheha-Ye aseman, Irã, 1998, 88 min.) Dir. Majid Majidi
27 de novembro – 3ª feira – 16h
Ali (Amir Farrokh Hashemian) é um menino de nove anos proveniente de uma família humilde e que vive com seus pais e sua irmã, Zahra (Bahare Seddiqi). Um dia ele perde o único par de sapatos da irmã e, tentando evitar a bronca dos pais, passa a dividir seu próprio par de sapatos com ela, com ambos revezando-o. Enquanto isso, Ali treina para obter uma boa colocação em uma corrida que será realizada, pois precisa da quantia dada como prêmio para comprar um novo par de sapatos para a irmã.
A cor do paraíso (Rang-e Koda, Irã, 1999, 90 min.) Dir. Majid Majidi
27 de novembro – 3ª feira – 19h
Mohammad tem oito anos e é aluno numa escola para cegos em Teerã. Com a chegada das férias, ele espera passar algum tempo com as irmãs, a avó e o pai no vilarejo onde mora a família. Viúvo, o pai encontra-se com dois problemas em relação ao filho: não tem mais condições de mantê-lo na escola especial, e pretende se casar novamente, sendo que o menino deficiente é como um obstáculo para isso. Por isso, não quer que ele passe as férias em casa, mas junto a um marceneiro cego que pode tomar o menino como aprendiz. O filme gira em torno desta delicada relação entre pai e filho, dos laços de família e da sensibilidade do menino cego.
Procurando Elly (Darbareye Elly, Irã, 2009, 104 min.) Dir. Asghar Farhadi
28 de novembro – 4ª feira – 16h
29 de novembro – 5ª feira – 16h
Após passar anos na Alemanha, Ahmad (Shahab Hosseini) volta ao Irã e seus amigos organizam três dias de comemoração. Sem que o resto do grupo saiba, Sepideh (Golshifteh Farahani) convida para a festa a jovem Elly (Taraneh Alidoosti), professora de sua filha. Ahmad, que acabou de se separar da esposa alemã e gostaria de começar uma nova vida com uma iraniana, vê em Elly a mulher perfeita. No dia seguinte, no entanto, ela desaparece misteriosamente. O clima entre os amigos torna-se amargo e acusatório, e eles iniciam uma pequena investigação para descobrir o paradeiro da moça.
A separação (Jodaeiye Nader az Simin, Irã, 2011, 123 min.) Dir. Asghar Farhadi
29 de novembro – 5ª feira – 19h
30 de novembro – 6ª feira – 16h
30 de novembro – 6ª feira – 19h
Após se divorciar da esposa Simin (Leila Hatami), Nader (Peyman Moaadi) é obrigado a contratar uma jovem para tomar conta de seu pai idoso que sofre de Alzheimer em estágio avançado. Porém, a diarista está grávida, e trabalhando sem o consentimento de seu marido, condições que junto a um terrível incidente, levará as duas famílias a um julgamento de cunho moral e religioso.
Fonte: Departamento de Difusão Cultural da UFRGS, através de Tânia Cardoso de Cardoso.
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