quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Crítica: Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância), ‏através de Marcelo Castro Moraes.


Fonte: www.google.com.br/imagens


Pegamos um exemplo básico: se eu simplesmente escrever a minha crítica sobre esse filme, no máximo ela alcançará umas cem visualizações hoje na minha pagina. Porém, se eu terminar ela e andar nu, na Avenida Ipiranga em Porto Alegre e segurando um cartaz com os dizeres “leem a minha critica seus filhos da p..” com certeza eu terei no mínimo umas noventa mil visualizações hoje.

Começo a minha crítica dessa forma pensando sobre o homem atual, com seu talento para dar e vender, tentando escrever os melhores textos ou interpretando os melhores personagens no palco. Contudo, se surge um garoto que sofre um pequeno acidente com o skate e grita um palavrão devido a isso, ele será muito mais famoso hoje postando esse momento no youtube do que um profissional da área da cultura que deu o sangue ao longo dos anos para nos passar algo minimamente criativo. Vivemos numa época em que o absurdo, voyeurismo, redes sociais e filmes com roteiros mastigados, para serem vistos pela massa cinéfila, dominam o mercado de entretenimento em proporções irreversíveis e Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) é o melhor filme do momento que sintetiza esse mundo contemporâneo que vive num verdadeiro cataclismo.

Tendo surpreendido em filmes como 21 Gramas e Babel, Alejandro González Iñárritu não mede esforços para apontar o dedo em todo o lugar que mereça uma analisada e uma crítica ácida. Em seu filme, Thomson (Michael Keaton) já foi um grande astro do cinema no passado, ao interpretar um famoso super-herói de HQ, mas no momento que desiste da cine série, vê sua carreira ir para o espaço. Tentando uma volta por cima na carreira, o protagonista dirige, roteiriza e atua numa peça teatral na Broadway, mas o mundo do entretenimento de hoje, e mais uma estranha voz que manda fazer algo que ele não quer, faz com que a qualquer momento seus planos deem tudo errado.

O refrão “arte imita a vida” se encaixa perfeitamente nessa obra, mais precisamente caindo no colo de Michael Keaton: após ter atuado em dois filmes do Batman na virada dos anos oitenta para os noventa, o ator se viu na participação de filmes que caíram no esquecimento e sendo somente lembrado como o ex-ator do homem morcego. Talvez o que vemos em Birdman é mais do que uma interpretação, mas sim as frustrações que são postas para fora, de um grande ator que se viu mastigado pela indústria, mas que busca uma redenção para a sua carreira e para sua própria vida pessoal.

Sendo assim, a trama já no início nos bombardeia com piadas de humor negro e críticas contra a própria Hollywood que, na visão pessoal do cineasta, vive hoje de franquias de super-heróis e que prendem inúmeros talentos a elas que, por bem ou por mal, tentam conseguir um reconhecimento pelos olhos da massa. Thomson se tornou um indivíduo que se recusa a se vender a esse sistema novamente, mas o mundo de histórias fáceis e redes sócias, com as suas notícias e vídeos instantâneos, lhe fazem ficar num beco sem saída que, lhe poderá arruiná-lo, mas que ao mesmo tempo ele poderia sair beneficiado. Não se vender ao sistema, mas não lutar contra ele seria uma derrota que poderia sair daí uma vitória? É uma realidade estranha, mas real, no qual vivemos nela e que o cineasta nos joga bem na nossa cara!

Esse duelo interior e exterior que o protagonista enfrenta nos proporciona momentos de puro delírio visual, que por vezes nos confunde, mas que rapidamente nos faz entender o que esta acontecendo na nossa frente. Tem-se então, não somente uma crítica verbal contra o sistema, como também visualmente, onde delírios e realidade do protagonista caminham de mãos dadas até chegar ao seu verdadeiro ápice. Atenção para a cena onde Thomson caminha pela rua, discutindo com o seu eu interior (mais precisamente Birdman) e nos proporcionando um dos momentos mais belos e imprevisíveis do cinema deste ano.

Antes mesmo deste momento sublime, Alejandro González dá uma verdadeira aula de plano-sequência que, se por um lado ele não inova, por outro ele faz disso algo bem criativo. A todo o momento a sua câmera está em busca de algo, como se houvesse um desejo de bisbilhotar o que acontece nos bastidores da peça a cada momento e destrinchando o lado frustrado e alienado dos astros e dos que trabalham nesse ramo. Embora perceptível o pulo do tempo em algumas cenas, o cineasta com certeza buscou inspiração de outros diretores que se arriscaram a fazer tamanho feito com os planos-sequências, como no caso de Alfred Hitchcock quando fez o seu Festim Diabólico.

Com a câmera que vai buscar o que acontece por detrás das cortinas de uma peça, acabamos conhecendo personagens coadjuvantes tão frustrados, que pensam somente em si, quanto o próprio protagonista: o ator que surta a cada momento (Edward Norton), a atriz que busca a realização de um sonho de estabilizar profissionalmente na Broadway (Naomi Watts), o agente do protagonista que busca sempre uma forma melhor de sair lucrando (Zach Galifianakis) e a filha deslocada (Ema Stone) do protagonista que, busca uma reconciliação com o pai, mas ao mesmo tempo terá que matar os seus próprios demônios interiores.

Personagens reais que, embora com talentos nas veias, são frustrados com a vida, mas que buscam um lugar nesse mundo concorrido, em que surgem a todo o momento celebridades instantâneas, mas que logo são esquecidas e substituídas por celebridades piores ainda. Uma trama que nos faz pensar e nos perguntar qual é o nosso papel nesse mundo louco, independente de qual profissão você exerça, pois no fundo você deseja um lugar ao sol para voar e sem se preocupar. Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) é isso e muito mais do que se possa imaginar.


Trailer

Fonte: www.youtube.com


Fonte: Marcelo Castro Moraes - Crítico Cinematográfico.

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